segunda-feira, 31 de outubro de 2016

"O Gato Preto", de Edgar Allan Poe

Outubro terminando, mais um Halloween e eis que resolvi postar um pequeno texto que, embora não tenha muito a ver com a data, apresenta elementos considerados de "má sorte", como o gato preto. Escrevi esse texto para uma aula de Literatura, em que tínhamos que escolher algum ponto de uma das leituras do semestre e escrever sobre isso. Optei pelo conto O gato preto, e quis comentar sobre a culpa e a consciência no narrador deste conto de Edgar Allan Poe. O tema, enfim, me pareceu muito interessante, embora eu talvez não tenha escrito o tanto que a temática em si merecia. Seja por tempo ou por falta de conhecimento a respeito disso. Ah, pequeno detalhe, tem spoiler. Enfim, segue abaixo, espero que não se decepcionem. =)

Bom halloween a todos!

Fonte: Pixabay.

Aclamado escritor de mistério e precursor de recursos narrativos ligados à ficção de mistério e à ficção policial, Edgar Allan Poe escreveu, em 1843, o conto O gato preto. Além de iniciar com um tema tão abrangente e questionador como o bem e o mal, a história aborda também a questão da culpa e da consciência, demonstrados por meio dos pensamentos do narrador e de seus atos de violência. O conto narra a vida de um homem que, impulsionado pela fúria e pelo alcoolismo, pratica ações desprezíveis contra vidas alheias, como privar seu gato preto de um de seus olhos e assassinar a própria esposa. 

Demonstrando ao leitor ter sido, por longos anos, uma pessoa amável e que adorava animais, ao ponto de criar vários deles, a mudança drástica de atitude causa um questionamento e uma particularidade da existência humana, que envolve tanto a adaptação quanto à capacidade de percepção dos atos infligidos. A própria consciência do narrador o mostra que houve uma mudança em si mesmo, e que foi uma mudança radical. E isso se percebe pelos comentários sobre seu passado e presente; as atitudes e personalidade antigas e as atuais (no conto). Apesar da consciência da crueldade que estava passando a ter, o narrador-protagonista não parece forçar-se a mudar, como se apenas compreender o que fora e é fosse o bastante. A culpa, de fato, cruel e devastadora, parece inexistente, até o momento que seu primeiro “crime” seja cometido, isso é, o assassinato de seu gato preto. 

A história continua se desenrolando após o aparecimento de outro gato preto, muito semelhante ao primeiro, inclusive quanto ao olho, sendo diferenciado apenas por uma marca branca no pelo, próxima ao pescoço. A partir de então pode-se começar a notar uma nova alteração nas atitudes do narrador, se sentindo quase que claustrofóbico, assustado, com a presença do gato, ao ponto de querer se livrar do pequeno. Numa tentativa, acaba por matar a esposa, e perder o gato de vista. Esse assassinato, aparentemente perfeito – isso é, sem possibilidades de que fosse descoberto –, aparentemente não causa peso na consciência do narrador, que parece apenas se questionar da localização do gato. Ao passo em que se poderia dizer que a ausência, explícita, de culpa, poderia ser resultado de uma consciência que parece mais em conflito com a mudança do decorrer de sua vida.

A parte final do conto associa-se a um outro conto do autor, O coração delator, cujos finais se aproximam quanto a um criminoso e a descoberta de seus crimes. No caso de O gato preto, o protagonista se sente tão convicto e livre da culpa que se delata, batendo na parede que esconde o cadáver da mulher. A culpa (explícita) sede espaço ao pavor, ao medo e à angústia. Emoções que também podem ser associadas à mente culposa.

Mais que um conto narrado por um personagem movido pelas sensações e fúria, O gato preto mostra uma faceta da humanidade; a mudança do indivíduo ao longo do tempo, a influência de elementos externos (como o álcool), a consciência dos próprios atos e, também, a culpa, que por vezes aparece não como arrependimento, mas como um medo, um pavor das consequências.

POE, Edgar Allan. O gato preto (Tradução de José Paulo Paes). In: POE, Edgar Allan. Histórias extraordinárias. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. Cap. 4. p. 69-79.