quarta-feira, 27 de julho de 2016

História dos Treze, de Honoré de Balzac #2


A particularidade dos gostos de cada indivíduo chega por vezes a ser surpreendente. Penso nisso, principalmente, ao observar o que as pessoas leem, o que mostram estarem lendo, o que comentam. O que é mais divulgado, o que ganha valor. Não é novidade alguma que os livros mais divulgados e compartilhados via redes sociais são livros contemporâneos e em sua maioria livros de fáceis leituras. Começa-se a reparar numa espécie de padrão; uma espécie de gostos e níveis de leitura – as pessoas estão lendo o que as agradam ou o que a divulgação lhes expõe? –, e o ponto que me chama a atenção é reparar e questionar-me como essas leituras são. Será que as pessoas realmente gostam do que leem? Será que não? Como será a criticidade desses indivíduos? O que os agrada? É inútil pensar nisso principalmente devido a toda a subjetividade que há no mundo; tudo é relativo. Só posso afirmar quanto a minha própria opinião.
Lendo A duquesa de Langeais – a segunda história do livro História dos Treze –, peguei-me pensando que, se esta fosse uma história escrita nos dias de hoje, pelos escritores de hoje em dia, eu muito provavelmente reviraria os olhos e detestaria, talvez até expusesse o quanto detesto “romances”, essa exposição tão exagerada que fazem de casais que tem de tudo no decorrer da história para jamais ficarem juntos, mas que tende a ser a história que imaginas o final feliz dos contos de fadas. Além de ter a certeza – eu posso estar equivocada, justamente por não ler este tipo de histórias – de que a narrativa seria tão simples que me desanimaria. “Ei, espera, mas Balzac não tem uma linguagem simples?”, poderias me questionar. E eu respondo com a maior convicção que, sim!, Balzac possui uma linguagem simples, fluída, para resumir, uma narrativa encantadora. A escrita, o desenvolvimento do livro de Balzac me cativou de uma forma impressionante. Acredito que a única forma de eu gostar de ler histórias românticas é por meio de narrativas balzaquianas ou como as de Jane Austen – apesar de só ter lido Emma até agora. Foi curioso reparar na espécie de aversão que senti ao imaginar A duquesa de Langeais numa escrita mais objetiva e sem as contextualizações tão cativantes de Balzac.
Embora a escrita de Balzac seja simples, não posso desconsiderar que possa ser um tanto exaustiva a quem não se encanta com reflexões, pensamentos e contextualizações de páginas e páginas para chegar ao que se quer falar – sim, ao ponto de em dado capítulo haver dez páginas até se alcançar o momento em que conhecemos, de fato, a personagem principal. Num exemplo para que essa “contextualização” fique mais clara, pensamos na seguinte situação: uma professora exige a leitura de dado livro, não comenta nada sobre ele, de modo que o leitor acabe chegando ao livro como se caísse ali de paraquedas; numa contextualização, a professora, antes de pedir a leitura do livro, faria uma espécie de introdução à temática, suponhamos que seja para a leitura de A Máquina do Tempo, de H. G. Wells, questionando aos estudantes o que sabem/pensam sobre viagens no tempo, que histórias ouviram/leram sobre isso. Essa pequena introdução poderia ser seguida pela informação de que há um livro que é o primeiro relato escrito que se tem conhecimento em que uma máquina era utilizada para viagens no tempo, e que esse livro é o que se pedira a leitura. Há diferença? Claro que muitas outras motivações/contextualizações poderiam ser muito melhores. É só um exemplo – e tanto se pode falar sobre motivação de leitura e contextualizações... –, que espero ter sido frutífero.
O que fiz agora não será talvez uma contextualização à história que li?

“Quando Balzac decidiu unificar a sua obra num grande conjunto intitulado A comédia humana, estes três livros, entre outros, foram colocados na série Cenas da vida parisiense. E de fato, nos três, Paris é um personagem dominante. Por meio de poderosas descrições das vielas, monumentos, mansões, palácios, Paris desfila diante do leitor com todo o seu mistério e sua grandeza, em descrições memoráveis que imortalizaram a cidade e impulsionaram o mito de Paris como a grande cidade do Ocidente diante dos leitores de todo o mundo.” (BALZAC, 2009, p. 185, introdução de Ivan Pinheiro Machado).

Assim como em Ferragus, embora não tão perceptível, em A duquesa de Langeais há a presença dos Treze Devoradores, grupo secreto de treze homens que fazem de tudo para se ajudarem, seja isso algo dentro ou fora das leis. Isso nos aparece mediante o sr. de Montriveau, um dos protagonistas do romance. A história, embora envolva diversos personagens – alguns participantes de outras histórias de A comédia humana –, poderia se resumir nas relações que se estabelecem entre dois personagens: o Armand Montriveau e a duquesa de Langeais, que dá título ao romance. Na introdução, tem-se a informação de que há, nessa história, algo de biográfico, um romance não correspondido de Balzac que lhe serviu de “inspiração” para a história – mas, por não me sentir apta a comentar a respeito, fica a sugestão de se pesquisar mais sobre isso.


O romance começa por seu final, ou melhor, seu quase final. De modo que sabemos, logo ao início, que Montriveau demonstra ter um grande amor pela duquesa, a ponto de ter ido atrás dela por quase todo o mundo, até encontrá-la num convento. Após esse encontro entre os dois é que, no segundo e terceiro capítulo – pois a história no todo só possui quatro capítulos, sendo o quarto à conclusão –, conhecemos quem são esses personagens, como eram suas vidas e o que passaram até chegar aquele encontro um tanto arrebatador. Acredito que podem ser feitas análises muito interessantes dos personagens e do desenvolvimento da história, que, por sinal, é fascinante, mas, aqui, me aterei a dois pontos – na verdade, a duas citações.

“Assim, a pureza de sua regra atraiu, dos pontos mais afastados da Europa, tristes mulheres cujas almas, despidas de todos os laços humanos, suspiravam por esse longo suicídio efetuado no seio de Deus.” (BALZAC, 2009, p. 189).

A citação acima se refere a um claustro, um convento, local descrito logo ao início do primeiro capítulo. Essa parte me chamou particularmente a atenção, tanto porque uma informação dessas não estaria ali à toa, quanto por seu teor, sua carga dramática de histórias que podem vir por trás disso. Nunca, até então, havia considerado o “recolhimento” de um indivíduo a um local sagrado como uma espécie de suicídio. Pelo meu texto de Os sofrimentos do jovem Werther imagino que ficou clara a minha atração por esses assuntos. Mas não o é, essa ida ao local afastado da sociedade, um ato de negar-se a si mesmo em favor de um outro? Que seja, nesse caso, a Deus? Essa recolha, essa extrema devoção a algo além de si mesmo, tende, por consequência, a negação de pensar em si mesmo, do egoísmo, do individualismo, do usufruto dos prazeres, do conhecimento... Da vida em sua liberdade. Não critico essa escolha, sequer sinto-me apta a apontar os motivos que levam a isso, o que resulta disso, o que há de positivo e negativo, enfim, tudo que se refere a essa escolha e essa fé. Apenas chamou-me a atenção pensar que refugiar-se na fé pode tanto ser um ato extremo de devoção quanto uma fuga de si mesmo, um suicídio.

“A igualdade será talvez um direito, mas nenhum poder humano saberá convertê-lo em fato.” (idem, p. 210).

Algo curioso é a forma com que questões importantes são colocadas de forma tão fluídas no texto que, numa leitura um pouco desatenta, pode-se chegar a não perceber os pontos que considero críticos, como a citação acima. Há um claro apontamento quanto à divisão social, e que, no fundo, remete à impossibilidade da existência do que chamamos de utopias – o que me lembra do livro Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley. Atualmente, tanto se discute sobre direitos iguais, sobre toda essa vontade e sede de que haja tratamentos igualitários, que, parece-me, ao ler esta frase de Balzac, que nós, humanos, ainda sonhamos, no fundo, por algo que se aproxime de uma utopia. Mas tememos a utopia, a rejeitamos vividamente, pois há o medo de que o eu seja apagado pelo nós, pelo coletivo, pela massa. Seria equivocado, então, pensar que se deseja a utopia em que se prevalece o desejo individual? E isso, por acaso, pode vir a existir?
No entanto, não é esta uma questão que a obra busca refletir sobre, apenas faz parte da contextualização, e, lendo-a, podemos parar e pensar. Talvez por isso eu demore tanto a ler...
Ademais, o romance é uma história mais romântica que política ou religiosa. É mais um elegante retrato de personagens parisienses. Um retrato também de personagens apaixonados, que veem na paixão – que se diferencia do amor – emoções arrebatadoras que os movem a ações impulsivas, a ponto mesmo de ignorar questões da sociedade, algo tão importante à época. É, por fim, um romance breve, com uma fluidez cativante, cuja leitura recomendo.
Não direi, contudo, que a considero uma história perfeita, afinal, apesar de todo o encanto que me causou, é um romance de época e poderia dizer, por exemplo, que muitos personagens importantes à história não são bem desenvolvidos, como o sr. Ronquerolles. Nesse ponto, porém, vem a importante informação de que, apesar de serem histórias individuais, muitas das reunidas em A comédia humana possuem personagens que se repetem, aparecem em mais de uma história, dado que se situam no mesmo universo, na mesma Paris, como é o caso da madame Sérizy, que aparece tanto em Ferragus quanto em A duquesa de Langeais. Resta afirmar que, embora a leitura não seja de todo encantadora para alguns, tenho de admitir que a história tem um desenvolvimento muito curioso no final do terceiro capítulo e no decorrer do quarto. Eu, particularmente, gostei bastante.


Pequena observação: a obra História dos Treze reúne três romances, em que cada um deles possui um tradutor diferente, sendo: William Lages (Ferragus); Paulo Neves (A duquesa de Langeais); e Ilana Heineberg (A menina dos olhos de ouro). Não sei se estaria certa em afirmar isso, mas pode-se notar diferenças na tradução da primeira e da segunda história, em que naquela se preferiu o uso de monsieur e nesta se preferiu a tradução para senhor. O que já demonstra a diferença de escolha dos tradutores. 

BALZAC, Honoré de. História dos Treze: Ferragus, A duquesa de Langeais, A menina dos olhos de ouro. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009. 420 p. Apresentação e introdução de Ivan Pinheiro Machado; Tradução de William Lages, Paulo Neves e Ilana Heineberg. 

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Demian, de Hermann Hesse

“Hoje sei muito bem que nada na vida repugna tanto ao homem do que seguir pelo caminho que o conduz a si mesmo.” (HESSE, 2006, p. 62).

Quando penso em narrativas, refiro-me à forma como a história se desenvolve, ao modo como o autor escreve. Talvez seja errado nomear isso de narrativa, não sei ao certo. Mas é a isso que chamo de narrativa. Parto do princípio de que antes de uma boa história, o livro precisa de uma boa narrativa. Porque é por meio da narrativa que o leitor irá construir sua leitura, entrar ou não no universo ali criado. É por ela que nos sentimos atraídos ou não pela história. Além de ser a narrativa um dos elementos utilizados para se definir se um livro é difícil ou não. Se há uma linguagem rebuscada, se é muito simples ou, talvez, incompreensível. Para mim, é parte essencial da obra, principalmente porque tenho apreço por livros que nos fazem pensar, que conseguem nos prender nos pensamentos do personagem, em suas reflexões, sejam elas sobre coisas banais ou de tanta complexidade que há a necessidade de uma releitura para o seu entendimento. Claro que há, aqui, o meu gosto por narrativas, há quem prefira textos objetivos e deteste enrolações e descrições. No entanto, gosto de pensar que são essas narrativas mais elaboradas que conseguem passar o quanto a linguagem consegue ser maravilhosa e encantadora. Um dos motivos de eu evitar alguns livros contemporâneos, afinal, é justamente esse; a narrativa tão objetiva e por vezes fraca – Celeuma? Talvez... Bom, claro que entram outras questões para esse estilo narrativo, o público, a temática, a bagagem literária... O comércio... Acho que me entenderam.
É por esse ponto que quero apresentar Demian, do escritor Hermann Hesse (1877-1962). A leitura da obra é incrível, tanto pela história, quanto, e principalmente por isso, pela narrativa de Herman Hesse. Já havia lido O lobo da estepe, e havia me encantado com a narrativa também, mas acho que a achei ainda melhor em Demian. Não é uma leitura que se diga difícil pela escrita, talvez seja difícil se buscarmos entender tudo que ali está escrito – e que vamos acrescentando ao ler –, pois no decorrer da obra parece que há um aumento na densidade de conteúdo apresentado. É um livro encantador e que, talvez por ser um bildungsroman, nos mostra a vida de Emil Sinclair desde sua infância, passando pela juventude e seu auge, que, pelo que entendi, é entre os dezoito e vinte anos. Ademais, não acho que teria capacidade para comentar com qualidade esse livro, pois muitas das questões ali apresentadas me parecem longe de minha compreensão. De modo que talvez percebam que minha visão da obra pode ser um tanto superficial demais. Ao mesmo tempo em que poderia deixar de comentá-lo, sinto que preciso apresentá-lo e mesmo conversar sobre essa excelente obra.

O livro, pelo que pode ser entendido pelo prefácio, é um pouco autobiográfico, mas todo livro não o é? Um dos “elementos”, não sei como definir isso, ou, talvez, uma das questões que o livro abarca, é a divisão entre o mundo luminoso, bom e puro e o mundo obscuro. Essa divisão, de início, parece-me bem fácil de delimitar, a leitura nos mostra uma divisão aparentemente bem clara, ao passo que parece ir se tornando mais densa conforme paramos para pensar. Para mim, essa foi uma temática parecida com a que abordei numa aula de estágio no Ensino Médio neste primeiro semestre de 2016, de modo que quando a questão começou a se ampliar, eu já retomei o que havia pensado anteriormente. O que eu quero dizer com isso?
Bem, pensemos que o bom seja o lado que nos leva a Deus – independente de acreditar ou não nisso, pensemos como o livro nos traz (ou mais ou menos nos traz, já que falo a partir da minha visão do livro) –, e o lado ruim, mal, o lado que nos leva ao Diabo. É um confronto entre luz e trevas, como se a separação fosse assim, óbvia e bem delimitada. Mas acredito que todos sabemos que não se pode responder dessa forma, tão simplesmente. Não existe pessoa perfeita, de modo que todos passamos tanto pela luz quanto pelas trevas. Na verdade, somos uma união desses dois lados, uma junção que nem sempre é clara e nítida. Até porque definir bom e mal partiria para o que é certo e errado, ao mesmo tempo em que isso depende de quais valores morais etc. estão a nós dispostos, e aos quais seguimos. Bem, desse ponto em diante não tenho capacidade de comentar muito, mas fica então a reflexão a vocês.

Afinal, e quanto à história?
Apesar de o título ser Demian, e Max Demian ser de fato um dos personagens principais da história, o narrador e protagonista é Emil Sinclair, um rapaz cuja família é religiosa e considerada por ele como pura, fonte e parte do mundo de luz. No primeiro capítulo, principalmente, vemos essa divisão dos dois mundos e como Sinclair fica transitando entre eles e pensando sobre isso. Era algo muitíssimo importante a ele, além de ser uma questão que o guiara por toda a trajetória de sua vida – a que temos conhecimento, pelo menos. O primeiro conflito da obra – se é que posso chamá-lo assim – dá-se na infância de Sinclair, em que ele se encontra na passagem entre os dois mundos.

“Pela primeira vez saboreei a morte. Tinha um gosto amargo. Pois a morte é nascimento, é angústia e medo ante uma renovação aterradora.” (p. 32).

As questões, um tanto existenciais, começam desde o início, em sua tenra idade, dando conversa com temas não tão leves, como a morte. Mas não a morte no que recorrentemente associamos como a morte física, mas a morte de parte de si, morte do que se até então considerava como seus valores morais etc. Morte de quem fomos e nascimento de quem estamos nos tornando a ser. Ademais, não é isso algo que, de um modo ou de outro, sendo em maior ou menor grau, pelo qual passamos em nossas vidas, uma ou outra vez? A passagem de uma fase à outra, a mudança de quem somos, o crescimento e conhecimento de si próprio...
Enfim, é a partir e depois desse primeiro conflito que Demian passará a exercer uma influência surpreendente em Sinclair. Max Demian surge como um novo aluno, sendo diferente, uma pessoa cuja idade não parece ser bem definida, um indivíduo desgarrado da sociedade por vontade própria, mas que nem por isso se considera de certo modo superior. Porque eis que o próprio orgulho é um problema. Mas essa é só uma visão superficial. É Demian quem irá ver em Sinclair a característica que permeia alguns indivíduos da sociedade, além de mostrar que o rapaz pensa mais do que é capaz de expor ao mundo.

“Vejo que pensas mais do que podes exprimir. Mas vejo também que nunca viveste completamente aquilo que pensas, e isso não é bom. Somente as ideias que vivemos é que têm valor.” (p. 80).

Mesmo podendo fugir um pouco do que se está falando no livro, parece-me que podemos associar com nossa sociedade atual, pensar, com essa parte isoladamente, nos indivíduos que pensam muito e o refletem, mas não o mostram. (E voltamos à questão das aparências engarem?). Pode-se pensar, também, num excesso de teoria que não faz sentido sem a prática – e vemos bastante isso quando estudamos licenciatura, porque é um debate feito devido sua imensa importância na formação do sujeito. No entanto, convém mencionar para que não se caía no ledo engano de pender mais para um lado do que para o outro, pois ambas, teoria e prática, são essenciais para um conhecimento significativo e produtivo.

“- [...] A maioria das pessoas vive também em sonhos, mas não nos próprios, e aí é que está a diferença.- Sim, é bem possível – murmurou. – Talvez o importante seja apenas saber em que sonhos vivemos...” (p. 135).

Outro ponto que considero importante comentar, mesmo que brevemente, é que o livro não é só sobre a formação e desenvolvimento de Sinclair, pois parece ir além disso, envolvendo o mundo que o cerca, sendo este, também, o nosso. Não está nosso próprio desenvolvimento num contato constante com o mundo, e sendo da vivência com ele que criamos e moldamo-nos? E eis que a sociedade entra nesse círculo, pois é com ela que convivemos, seja direta ou indiretamente, pois sempre há o risco da socialização vir a ser inevitável – e quantas pessoas já não se deixaram levar por grupos que lhes levaram a caminhos inadequados? Acompanhando o desenvolvimento de Sinclair, vemos ambos os lados, ambos os mundos, e uma busca infindável por aquilo que mais lhe apraz.
Ademais, tenho de comentar que a edição que li possui alguns errinhos, algumas frases que poderiam possuir umas modificaçõezinhas para tornar mais compreensível, coisas que imagino serem da tradução e/ou revisão, mas que também acho que devem ter sido arrumadas na última edição. Ou assim espero. Aliás, como podem ter reparado na foto acima, está escrito, na capa, "venda proibida", pois bem, explico-lhes que peguei o livro emprestado de uma escola estadual de Içara; é mais ou menos a mesma situação do livro de Balzac, disponibilizado à escola pelo Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE). Por sorte, encontrei-o lá este mês (<3), digo isso pelo fato de que Demian  foi a leitura escolhida do mês de julho para o Clube do Livro que participo. Depois de já estar com o livro em mãos, encontrei-o numa livraria, com a capa amarela bonitinha, que pode ser vista abaixo – não é difícil encontrar esse livro –, e quis comprá-lo, pois desde que li a resenha do blog O epitáfio – aliás, recomendo que leiam a resenha dele – fiquei encantada com a capa, mas, graças à pessoa da minha irmã, comprei outro livro no lugar (O gigante enterrado~ *-* Conhecem? Parece muito bom!). Pois bem, gostaria de poder comentar a capa, mas talvez isso pudesse ser spoiler e tirar um pouco da graça da leitura. Basta dizer que o desenrolar da metade em diante, embora um pouco mais denso, talvez, é surpreendente.


As imagens das capas eu retirei do Skoob. Reparem na grande diferença que há de uma capa a outra. Particularmente adorei a primeira da fileira de baixo, do lado esquerdo.

Enfim, espero que tenha sido uma visão não muito distante da obra, e que tenha conseguido demonstrar que, apesar de conter muitas coisas, é uma leitura que vale muito a pena. Resta apenas pensar, é Demian um ouriço? Fiquei meio na dúvida; embora a capa me gerou curiosidade, pois não me fazia sentido, e comparando-a com outras fez menos sentido ainda, ela está tão relacionada à história que é difícil comentar (aliás, eu achava que era uma fênix, mas, pelo que entendi, é um gavião). Então, por essa visão, não, não é, pois embora a capa não reflita toda a grandeza da obra, reflete grande essência dela – é difícil uma capa fechar inteiramente com a obra, não? Contudo, se analisarmos ser de um autor um pouco desconhecido, geralmente associado a esse amontoado de questões que traz, de certo onirismo, com a possível crítica e tudo o mais... Além de capas que podem não atrair novos leitores... Bom, nesse caso eu consideraria um ouriço. Mas deixarei a decisão desse em aberto. Leiam e digam-me suas opiniões. =)

HESSE, Hermann. Demian. 37. ed. Rio de Janeiro: Record. 2006. Tradução e prefácio de Ivo Barroso. 188 p.

quarta-feira, 13 de julho de 2016

História dos Treze, de Honoré de Balzac #1


Às vezes, embora gostemos bastante de um livro, podendo até colocá-lo como favorito, não o pegamos para ler no momento certo. Porque, acredito, a leitura por vezes precisa desses momentos certos. E porque nossa bagagem literária no momento da leitura conta muito, já que, nas palavras da Teresa Colomer (2003, p. 98), “A mensagem não se transmite do autor para o leitor, mas se constrói, como uma espécie de ponte ideológica, que se edifica no processo de sua interação.” Por vezes, se não houver um “material” adequado, a ponte se tornará fraca e feia, não aproveitando ou até não construindo uma ponte decente. É mais fácil exemplificar com livros teóricos, embora a Literatura abranja muito bem essa ideia também. Sem chão, a árvore não cresce. Aliás, tem-se que ver também que, às vezes, ter esse “material” pode possibilitar uma criticidade maior de modo que o leitor venha a definir alguns livros como ruins ou fracos. Toda leitura é uma nova leitura, mesmo a releitura de um livro é uma nova leitura, pois são momentos diferentes, o leitor já está com uma bagagem diferente.
Imagino que, embora eu fosse gostar muito de um livro do Balzac, quando o tomei em mãos no Ensino Médio, somente agora percebo que estou, de fato, aproveitando a leitura. Na época, porque não tinha tanto tempo para ler, e eu não dedicava tanto tempo a isso, abandonei o livro após a leitura do primeiro romance que há no livro. O livro em questão, História dos treze, contém três histórias diferentes, mas que possuem um ponto em comum – o grupo dos devoradores –, que são, em ordem: Ferragus, A duquesa de Langeais e A menina dos olhos de ouro. Como já mencionei, o peguei emprestado da biblioteca da escola durante o Ensino Médio – e, acreditem, escolas públicas têm uns exemplares maravilhosos –, mas, pelo fato do prazo de entrega do livro, por ser grandinho, 420 páginas e tudo o mais, acabei devolvendo após ler somente Ferragus. O engraçado é que eu tinha gostado. E só fui retornar ao livro agora, em 2016, quatro anos, quase, depois de tê-lo abandonado. E pode dizer que, com certeza, estou aproveitando-o muito mais agora. Tanto pela bagagem literária que obtive nesse tempo quanto experiências num geral, e tenho de afirmar: o momento da leitura é importante e influencia muito. E isso só demonstra, pelo menos para mim, que a leitura de livros mais complexos, difíceis ou mesmo chatos, precisa, às vezes, ser feita, para que crie-se uma bagagem cada vez mais completa e crítica. Ler sempre do mesmo pode ser limitador.
Então, durante o período de estágio do curso de Letras, tive a oportunidade de rever esse livro e tomá-lo emprestado. A leitura ainda não foi terminada, mas já queria comentar sobre a primeira história, Ferragus. A obra é do escritor francês Honoré de Balzac (1799-1580), e se passa na cidade de Paris. Grande parte de sua obra, pelo que li, se passa nessa cidade. Paris é quase como um ser vivo, um ser que é descrito com uma acuidade surpreendente. É na descrição dessa cidade francesa que começa a história de Ferragus, o chefe dos devoradores.

“Existem em Paris algumas ruas de tão má reputação quanto a que pode ser atribuída a um homem que cometeu alguma infâmia; existem também ruas nobres, ao lado de ruas simplesmente decentes; um pouco mais além, estendem-se ruas jovens, sobre cuja moralidade o público ainda não teve tempo de se decidir; e há ruas assassinas; ruas mais antigas que as mais velhas das viúvas ricas; ruas simpáticas, ruas sempre limpas, ruas sempre sujas, ruas operárias, trabalhadoras, comerciais. Em uma palavra, as ruas de Paris têm qualidades humanas, e seu aspecto geral nos impõe certas ideias contra as quais nos sentimos indefesos” (BALZAC, 2009, p. 27).

Esse começo já diz muito do que se poderá esperar no decorrer de todo o romance. Balzac costuma, pelo que percebi em Ferragus, contextualizar, partir de uma questão mais ampla, descrevendo-a com calma, antes de chegar ao ponto da história em si. Ferragus começa falando da cidade de Paris, e somente após conhecemos o primeiro personagem importante da história, o monsieur de Maulincour. Primeiro porque ele é, digamos, o responsável por todo o desenrolar da história. Conhecemos o monsieur de Maulincour e sua história praticamente inteira, até o momento presente da obra, em que ele está encantado, ou melhor, apaixonado por madame Jules. Nessa parte, aliás, é curioso ver a descrição ou reflexão que se faz acerca dos amantes, das pessoas que se enamoram; há uma diferença marcante entre amar a distância e ter esse amor por perto.
Antes de continuar, convém estabelecer uma informação crucial para a leitura de Balzac, caso não se tenha um contato prévio com obras desse tipo. Não pela dificuldade da linguagem, que, aliás, é bem simples, mas por toda a construção dos valores da sociedade. É preciso ver que há uma diferença enorme entre a valorização do respeito e sentimentos da história do livro, da época, com a nossa atualidade. É algo bem diferente mesmo, dado que em nossa sociedade – desculpem-me a generalização, mas nesse caso é preciso, e, diga-se de passagem, todos sabem que há exceções – prevalecem as relações efêmeras, o individualismo e a pouca importância com a situação alheia. Não há uma questão de honra ou de orgulho do mesmo estilo da obra de Balzac. Reconhecer isso é fundamental, afinal, embora haja um romance, é obviamente diferente dos livros contemporâneos. E um leitor desavisado irá muito provavelmente detestar essa leitura, permitir que uma estranheza imensa se ponha entre a obra e o leitor. É uma sutileza talvez quase imperceptível por seres efêmeros de relações efêmeras. Enfim, cabe dizer que a obra é muito mais do que esse enredo que aparece. É como Ossofrimentos do jovem Werther, há ali uma história, mas há muito por trás disso.

Voltando ao enredo. Monsieur de Maulincour, um membro da Guarda Real, percebemos, encontra sua amada na Rue Soly, uma rua infame, por assim dizer. Um local que não se espera encontrar pessoas da classe de madame Jules. Com isso, Maulincour se sente traído, como se ela fosse responsável por duas traições, traindo a ele e ao marido, o monsieur Desmarets. Isso o faz investigar o que ela fazia ali; é quando conhece a figura curiosa e enigmática de Ferragus. A partir de então, se sucedem algumas tentativas de assassinato a monsieur de Maulincour, que acaba por associá-las à madame Jules; a seu ver, ela está por dentro do que está sendo feito a ele, e resolve falar com ela. A partir de então o foco do romance muda, mostrando-nos mais a história de madame Jules e monsieur de Desmarets, que passa a desconfiar que sua esposa esconde algo. Acho que a partir dessa parte é interessante deixar que o leitor descubra o que acontece. Não por ser spoiler, mas porque prefiro comentar outros pontos que gostei e deixarei que a leitura da obra satisfaça esses buraquinhos de meu resumo.

“O ofício de espião é muito divertido, quando praticado por vontade própria e em benefício de uma paixão. Afinal de contas, é como conceder a si próprio todos os prazeres do ladrão, ao mesmo tempo em que se conserva a honestidade... Mas é preciso resignar-se a ferver de cólera, a rugir de impaciência, a gelar os pés na lama, a tremer de frio enquanto se queima por dentro, a alimentar-se tão somente de falsas esperanças.” (idem, p. 54).

Um personagem curioso e até intrigante é o personagem que dá título ao romance, Ferragus. Encoberto por diversos nomes e personalidades, Ferragus demonstra que se poderia haver um romance inteiro só de sua vida, e não sei se ele volta a aparecer em outras histórias de A comédia humana, mas gostaria que aparecesse. Apesar de sua importância, só viemos a conhecê-lo de fato da metade da história em diante e, mesmo assim, senti que ainda poderíamos saber muito mais sobre esse personagem tão curioso, que vem a ser o chefe dos Devoradores – um grupo composto de treze integrantes, tão unidos que são capazes de tudo para ajudar outro membro do grupo, mesmo que isso infrinja as leis. O próprio grupo dos Devoradores não é um “protagonista”, é mais um pano de fundo, a base da história, como percebemos. No prefácio e introdução da obra, vê-se que, naquela época, esses grupos ocultos, secretos estavam na moda, e Balzac soube usar disso para criar suas obras-primas.
Em minha opinião, o melhor de tudo na obra ainda é a forma com que Balzac escreve. Claro que li uma tradução e então minha opinião acaba não correspondendo de fato com a escrita de Balzac, mas pela tradução, feita por William Lagos, percebi uma escrita fluída e, por que não?, gostosa de ler. Cada mudança de foco tem sua contextualização, não chega ao leitor como se caísse de paraquedas. Ao falar da mentira de uma personagem, por exemplo, o capítulo inicia falando que todas as mulheres mentem, em algum momento, por algum motivo, que seja algo mais drástico ou mesmo uma surpresa. Claro que aí poder-se-ia criticar e dizer “os homens também mentem”, mas não é o foco do capítulo, que é a contextualização da mentira feminina. Aliás, é algo simplesmente fascinante. Ao começar a ler a obra, a narrativa me encantou de tal modo, que consegui imaginá-la sendo lida em um grupo de amigos. Numa daquelas cenas mais clássicas, talvez como no livro A Máquina do Tempo, de H. G. Wells, em que as pessoas se reúnem numa sala ao calor da lareira e uma delas se torna a narradora de uma história para o grupo. Estranho? Talvez.

“É por isso que existe este axioma: Toda mulher mente. Uma mentira distraída, uma mentira venal, uma mentira sublime ou uma mentira ignóbil; é como se sentissem a obrigação de mentir. Admitida essa necessidade inconsciente, não é uma decorrência necessária que saibam mentir bem? Pelo menos na França, as mulheres mentem admiravelmente. São nossos próprios costumes que lhes ensinam desde meninas a faltar com a verdade!” (ibidem, p. 83).

Por fim, apenas mais dois breves comentários. Primeiro quanto à forma que os assuntos “morte” e “cemitério” aparecem. Ao mesmo tempo em que parecem assuntos fortes e dolorosos, percebi umas partes um tanto quanto cômicas e que parecem ser tanto um questionamento da organização social quanto uma crítica da futilidade que é toda a regra social. E, segundo, quanto ao fato de que a história, embora seja “fechada”, dá a impressão de que se poderia ler muito mais sobre. Pretendo suprir essa vontade de ler mais sobre essa visão de Paris com outras obras de Balzac. Ainda farei, provavelmente, resenhas das outras duas histórias do livro, A duquesa de Langeais e A menina dos olhos de ouro. Mas, por enquanto, espero que tenham se interessado pela obra de Balzac. =)


BALZAC, Honoré de. História dos Treze: Ferragus, A duquesa de Langeais, A menina dos olhos de ouro. Porto Alegre, RS: L&PM, 2009. 420 p. Apresentação e introdução de Ivan Pinheiro Machado; Tradução de William Lages, Paulo Neves e Ilana Heineberg.
COLOMER, Teresa. A formação do leitor literário: a narrativa infantil e juvenil atual. São Paulo: Global, 2003. Tradução de Laura Sandroni.

domingo, 10 de julho de 2016

Caçando Ouriços nas Férias: planos iniciais!

Olá, pessoal!

Por sugestão da Helena, do Leituras & Gatices, resolvi mostrar o que pretendo ler nessas férias. Como já se passou uma semana, já tem umas leituras concluídas, mas acho que mesmo assim está valendo. Também por sugestão dela, a partir de agora começarei a verificar e expor se essas leituras são ouricinhos, isso é, se a visão inicial, exterior, que se tem da obra difere-se da visão ao término da leitura. Em Os sofrimentos do jovem Werther, por exemplo, diria que é um ouricinho sim, porque a capa, embora visualmente bonitinha, pode desanimar a leitura  além de que tem umas capas de outras edições que realmente me desmotivariam a lê-lo. Em relação à obra do Goethe, ainda, muito se poderia fugir por causa da temática  há quem não leia só pelo drama? Sim, há , mas, ainda assim, afirmo, é um ouricinho, leiam!

Bem, considerando que semestre que vem estarei no tão abominável TCC, que na verdade só é um trabalho que ocupa muito tempo, acabei tendo que deixar espaço para leitura de referencial para a faculdade. Mesmo assim, me propus a ler sete – número mágico  livros de Literatura, dos quais em sua maioria as capas são bem bonitinhas e, por isso, espero que não sejam ouricinhos, já que isso significaria história fraca e/ou ruim.


História dos Treze, de Honoré de Balzac.
Esse foi o primeiro cuja leitura finalizei nessas férias, e já tem texto pronto aqui para o blog. Aliás, serão três textos, porque a obra engloba três histórias diferentes: Ferragus, A duquesa de Langeais e A menina dos olhos de ouro. Não adiantarei muito, porque os textos já falarão por si sós, mas convém dizer que achei sim um ouricinho, porque vejam a capa... É bonita e tudo o mais, mas não animaria a ler, caso não conhecêssemos o autor ou tivéssemos alguma ideia da grandeza que é A comédia humana. Um fato que esclarece isso é o uso meio exagerado, talvez, de frases de outros autores famosos sobre a obra de Balzac na contracapa, na orelha e na introdução da obra. Não seria esse exagero uma forma de dizer "leiam porque é bom", já que a sinopse e a capa por si só não fazem isso? Está lançado o questionamento.


Lugar Nenhum, de Neil Gaiman.
Essa foi a segunda leitura que conclui nas férias, aliás, terminei ontem (09/07), e adorei! Não pretendo resenhá-la aqui, mas caso queiram conhecer a obra, recomendo a leitura da resenha da Helena (ela que me emprestou o livro, aliás~ <3), que traz uma visão sobre o livro. Tenho de dizer apenas que a capa combina muito com a história e, por ser uma capa bonita, não considero um ouricinho. 

Demian, do Hermann Hesse.
Esse é o livro da leitura deste mês para o Clube do Livro que participo, cuja temática parte de livros que sejam aventura ou mais filosóficos, coisas do tipo. Já li outra obra do Hermann Hesse, e me parece que valerá muito a pena. Além disso, a capa me parece curiosa, não sei se será um ouricinho. Veremos. Como não me atrevo a trazer uma sinopse ou mesmo resumo do livro, já que ainda não o li e muitos sabem estragar o livro com seus resumos, recomendo a leitura da resenha do Elder no blog O epitáfio, que está bem interessante!


Estação Onze, da Emily St. John Mandel.
Essa é uma leitura que estou devendo desde janeiro, pois ganhei de um amigo, e enfim resolvi lê-la. Aparentemente é um livro bem dramático e meio pós-apocalíptico. A capa é lindinha e estou bem empolgada para ler esse livro – que não recomendo para ler em ônibus e tal, porque a fonte é pequena –, espero que não seja um ouricinho. 

Sangue na Neve, do Jo Nesbo.
Tenho que admitir que minha vontade de ler esse livro resultou de uma curiosidade que a sinopse do Skoob me passou, então a colocarei abaixo. Gostaria de ver como o autor escreveu essa história... Ao mesmo tempo, espero que não seja um ouriço, porque a capa é muito linda e tem relevo!
O mestre do thriller escandinavo está de volta. Olav tem apenas um talento: matar pessoas a sangue-frio. Não há nada que ele preze mais que ter o poder sobre a vida e a morte. Porém, sua natureza sensível é proporcional às suas habilidades como matador de aluguel. Uma vez tentou roubar bancos, mas não deu certo – ele se sentiu tão culpado que foi visitar uma das vítimas no hospital. Agenciar mulheres para prostituição, idem – Olav se apaixona muito fácil. O assassinato foi tudo que lhe restou.
Ele leva uma vida solitária em Oslo até se ver envolvido em um trabalho importante para um dos mais perigosos chefes do crime organizado na cidade, Daniel Hoffman. Ao aceitá-lo, Olav finalmente conhece a mulher da sua vida, mas logo se depara com dois problemas. O primeiro é que ela é a esposa do chefe. E o segundo é que ele foi contratado para matá-la.
O jogador, do Fiódor M. Dostoiévski.
Tanto esse livro quanto o debaixo são de um escritor cuja escrita muito me encanta. Aparentemente meio óbvio, o livro vai retratar um personagem viciado em jogos. Isso, a capa e ainda somando a escrita de Dostoiévski... acho que não será um ouriço. 


Duas Narrativas Fantásticas, do Fiódor M. Dostoiévski.
Por último, esse livro não será uma leitura, e sim uma releitura, pois já o li no ano passado. Foi a primeira obra que li de Dostoiévski, e sinto que não aproveitei tanto, então quero relê-la e, talvez, comentá-la por aqui. A obra abarca duas novelas, A dócil e O sonho de um homem ridículo.

Bom, essas são as leituras que me propus, e que espero conseguir ler ao menos cinco delas. Quando as férias terminarem comentarei se são ouricinhos e se valem a pena serem lidas, afinal, a visão inicial sempre pode nos enganar. =)

E vocês, já encontraram algum livro ouriço nessas férias?

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Os sofrimentos do jovem Werther, de Johann Wolfgang von Goethe

“E, todavia, ser incompreendido, é esse o destino da gente!” (GOETHE, 2014, p. 21).

Dizem com muita frequência que a única certeza que temos na vida é a morte. Todos os seres vivos um dia morrerão! Essa morte pode se dar naturalmente – por velhice –, por doenças, acidentes ou... Por vontade de extinguir a própria vida. Sim, suicídio. Apesar de ser um ato individual que não provoca efeitos físicos em outros seres vivos, o suicídio costuma ser um tabu, algo que as pessoas evitam pensar, até que, por um motivo ou outro, são obrigadas a pensar a respeito. Seja um personagem de livro que se suicide, ou algo da vida real. Seja conhecido ou completo desconhecido. O maior fato, e talvez mais trágico do que o próprio suicídio, é que as pessoas não sabem lidar com isso, não possuem um pensamento mais complexo do que “covarde”, “não devia ter feito isso”, “devia ter esperado a situação se acalmar” etc. Não exponho essa questão como se soubesse ou já tivesse lidado com isso, mas, como muitas pessoas, em algum momento da minha vida, já pensei a respeito sobre isso – e é isso que considero importante, pensar a respeito. Antes de qualquer outra coisa, convém relembrar que cada caso é um caso, que tudo é relativo, e que se deve, sempre que possível, evitar os conceitos prévios e equivocados que fazemos dos outros.

“De resto, meu caro, dia a dia vejo com mais clareza quão estúpido é o ato de julgar os outros pelas nossas próprias faculdades.” (op. cit., p. 91).

É compreensível que as pessoas não gostem de tocar nesses temas, pois por vezes estão envoltos por camadas tão frágeis de nossas próprias existências que tememos essa fragilidade, o desconhecido que vem disso, o sofrimento e a angustia de saber que, na verdade, nada sabemos. Mesmo agora, escrevendo sobre isso, parece-me que mesmo cem páginas que eu viesse a escrever ainda estariam incompletas, sendo apenas um poucochinho insignificante sobre a extensão e complexidade que é o ato de tirar a própria vida. Meus conhecimentos sobre isso se resumem ao que li e refleti em alguns poucos livros de Literatura. Se me recordo bem, os livros mais recente que li sobre isso foram: A playlist de Hayden (Michelle Falkoff), que li em 2015, apesar de que este livro bonitinho era mais sobre bullying do que sobre suicídio; e A elegância do ouriço (Muriel Barbery), em que uma das narradoras decide pôr fim a sua vida no seu aniversário de treze anos caso não encontre um sentido para a vida – a citação abaixo é uma fala dessa adolescente sobre suicídio. Enfim, a questão é que posso estar aqui falando besteira e comentando muito mal sobre um livro fantástico. Peço desculpas, afirmando que meu único objetivo é colocar para fora, jorrar em palavras o que penso sobre isso – pelo menos uma parcela disso –, e agradeceria se corrigissem quaisquer eventuais comentários equivocados.

“E também, acima de tudo, lancei a mim mesma um pequeno desafio: se a gente se suicida, deve ter certeza do que faz e não pode queimar o apartamento “a troco de nada”. Então, se existe alguma coisa neste mundo pela qual vale a pena viver, não devo perdê-la, pois, quando estiver morta, será tarde demais para ter arrependimentos e porque morrer por termos nos enganado é, de fato, muito idiota” (BARBERY, 2008, p. 36, Paloma).

Por mais óbvio que possa ser, no fim das contas, ninguém sabe o que acontece depois da morte. Ninguém sabe se o suicida tem um destino diferente. Quem sabe acabe tudo da mesma forma. Quem nos dirá?
Apesar dessa introdução grandinha, devo dizer que este texto é, na verdade, uma espécie de resenha de um livro simplesmente fantástico que aborda esse assunto: Os sofrimentos do jovem Werther, do alemão Johann Wolfgang von Goethe. Escrito em 1774, e com muitos pontos que provém da realidade, isso é, com muitos fatos autobiográficos e com episódios de fato acontecidos – mas não o é toda literatura uma cópia de parte da realidade? –, a obra é uma junção de várias cartas do jovem Werther a seu amigo Guilherme e, posteriormente, a Carlota e Alberto. Se fosse para descrever em uma frase, usaria a disposta na contracapa do livro – pela edição da L&PM –, “Uma paixão devastadora e mortal”. Mesmo para aqueles que não conhecem a obra, não considero um spoiler maldoso dizer que o jovem Werther, o protagonista sentimental e romântico, acaba por se suicidar. Mesmo a quem considere isso um spoiler, afirmo: Leiam! Eu li com a quase certeza de que ele se mataria, li já percebendo as deixas de que poderia ser levado a isso, de que poderia ser capaz de dar fim a própria vida, e a experiência, asseguro, foi maravilhosa. Um livro singular que fala de suicídio como nenhum outro da Literatura que conheço e li até então – aceito recomendações, aliás. E que, além disso, consegue abordar tantas outras coisas! Consegue falar de classes sociais, de trabalho, de amizade, de mau humor! Já pararam para pensar no quanto o mau humor, nosso próprio mau humor, afeta a nós a ao nosso meio?

“Não será o mau humor muito antes uma insatisfação íntima com a nossa própria indignidade, um descontentamento com nós mesmos, que sempre vem atado a uma inveja, fomentada por uma vaidade insana? Vemos homens felizes cuja felicidade não é obra nossa e isso nos resulta insuportável.” (op. cit., p. 51).

A obra data do século XVIII, mas algumas frases são tão atuais, que podemos refletir sobre elas, assim, fora do contexto, como a citação acima. Sobre o nosso mau humor conosco, nosso mau humor que provém da felicidade alheia não ser resultado nosso etc. Pensemos um pouco: em pleno século XXI, como o mau humor nos afeta? Às vezes, diria até muito frequentemente, acabamos passando esse mau humor aos outros, descontando em pessoas que nada tem a ver com nossos assuntos. Quantas vezes deixamos de ser bem atendidos por um funcionário incomodado com algo totalmente desconhecido a nós? Quantas vezes descontamos a raiva, frustração ou mesmo decepção em alguém que nada tem a ver com o problema? Quantas vezes, sem perceber, nos incomodamos com tão pouca coisa, deixando isso afetar todo nosso dia? De fato, devemos, às vezes, desabafar nossos problemas, resolver a fonte de nosso mau humor etc. Afinal, é fato que guardar tudo para si mesmo faz mal.
Às vezes, tudo que falta é parar, respirar e ver o que se está fazendo. Ao mesmo tempo, nessa época tão corrida, parece que isso é impossível. E, talvez, às vezes, seja mesmo. Mas o que é o impossível ante toda uma vida pela frente? O que são quinze minutos para evitar horas e horas de mau humor, desentendimentos e arrependimentos?
(Não, isso não é um texto estilo autoajuda! Ou talvez seja?)
Muitas vezes o que falta é a pessoa se conhecer, compreender a si mesma, reservar um tempo para descobrir-se, deixar se conhecer.  Afinal, o “descontentamento com nós mesmos” (op. cit.) pode ser pouco ao início, mas seu acúmulo pode deixar-nos cegos quanto à beleza que se expande ao nosso redor, como quanto aos pequenos gestos gentis de nossos colegas. Conseguem ver a relação disso com o suicídio?
Como já disse, é uma questão bem relativa, bem subjetiva, que um texto tão curto quanto este pode vir a ser o mesmo que nada, dado que cada caso é um caso. Bem, um exemplo meio... Simples, talvez, seria pensar o seguinte: se não vejo em mim mesma nada de agradável e passo a dedicar toda minha vida a uma pessoa que considero maravilhosa, de modo que toda minha existência seja a contemplação e atuação para a melhor condição dessa pessoa, quando esse ser partir, o que será de mim? O que tenho em mim que me faça ter vontade ou mesmo coragem de continuar? Nada, resta a morte. O suicídio pode vir a ser tanto um desgosto com o mundo quanto um desgosto consigo mesmo.
Um exemplo parecido com esse – acho que acabei de plagiar Goethe, sorry – aparece no livro, num trecho que acho incrível, disposto na citação abaixo. Para que se melhor entenda o contexto da citação, convém agora explicar o enredo da obra de Goethe. Werther, aparentemente, muda-se para outra cidade (será que posso chamar de cidade?), para longe de seu amigo Guilherme, sendo a partir de então que lemos suas cartas. De início vemos sua reação com o local e com a natureza, vemos o rapaz sensível que ele é. Até que, ainda ao começo, vemos que ele relata estar encantado, apaixonado por uma moça chamada Carlota. Acontece que ela já está comprometida, noiva, de Alberto. Esse é, em resumo, o enredo central da obra. Apesar de seu imenso amor por Carlota, ele não pode ser correspondido, o que gera sentimentos e ações um tanto quanto dramáticos. Tudo envolto no plano de fundo do sentimentalismo com a natureza e com o que o cerca. Werther, numa conversa com Alberto – o noivo de sua amada –, acaba por apontar uma arma descarregada à própria cabeça – num gesto sem a intenção de se matar, pois sabia que estava descarregada –, o que traz à tona o assunto do suicídio. Nisso, Werther comenta a história de uma jovem moça que dedica toda sua vida a um rapaz que a abandona, e, em meio ao diálogo, expõe a fala abaixo.

“Ai daquele que, à vista disso, fosse capaz de dizer: ‘Que louca! Se tivesse esperado, se houvesse deixado o tempo correr, o seu desespero ter-se-ia acalmado e em breve encontraria um outro que a consolasse’. É exatamente como se alguém dissesse: ‘O louco vai morrer de febre! Se tivesse esperado até que suas forças voltassem, até que se houvessem corrigido seus humores e apaziguado o tumulto de seu sangue, tudo se restabeleceria e estaria vivendo até hoje’.” (op. cit., p. 72).

Muito se pode dizer sobre esse trecho, mas gostaria de comentar que nem tudo é simples, que esperar (não) resolve. Nem sempre se encontra uma pessoa que salvará sua vida como se pode, possivelmente, encontrar em histórias contemporâneas – não digo que é errada essa visão, pelo contrário, às vezes é muito bom saber que há algo melhor à frente, que podemos encontrar um ponto de alívio. O que enxerguei no trecho é isso: você pode esperar até morrer de velhice e não dar em nada; às vezes, não há como esperar. A realidade, queridas pessoas, nem sempre vai lhes pôr uma âncora na qual poderão se fixar nos piores momentos que passarem. Não é querer ser pessimista, nem realista demais. Num mundo ideal todos encontrariam esse ponto de salvação, essa solução, essa paz... Mas o que vemos? Os suicídios continuam... Ao mesmo tempo, não acho que isso seja um incentivo ao suicídio caso se esteja passando por situações semelhantes. Pelo contrário! Vejo nisso, além de uma forma incrível de encarar a vida por meio da Literatura, uma forma de dizer que precisamos pensar e construir a nós mesmos, quem somos, quem queremos ser. Além disso, a citação também demonstra outra questão essencial: não devemos julgar sem saber o que a pessoa estava passando e sentindo.
É comum dizermos “há pessoas em situações piores” e julgarmos nossa situação indigna de insatisfação. “Reclamas do frio? Há quem morra literalmente de frio”. Sabem, precisamos, claro, levar em consideração nossa sorte de não estarmos pior, mas precisamos, também, considerar que cada contexto é um contexto, que cada pessoa possui um limite diferente. O que para mim pode não ser nada, ser o mesmo que ver a poeira sendo varrida para a rua, para outra pessoa pode ser algo que lhe arranque as entranhas! Enquanto para um sujeito tirar zero numa avaliação seja o fim do mundo, para outro isso não significa nada.

“Essas são mais algumas das tuas extravagâncias”, disse Alberto. “Exageras tudo e, por certo, cometes pelo menos o erro de aceitar o suicídio, que é do que estamos falando agora, como se fosse uma grande ação, quando não é nada mais do que simplesmente fraqueza. Pois, para ser sincero, é mais fácil morrer do que suportar com firmeza uma vida de tormentos.” (op. cit., p. 69).

É fácil dizer que foi fraqueza de uma pessoa, ou mesmo estupidez, ter se matado por “ser abandonado”, mas será que sabemos como o sujeito realmente está? Será que sabemos como realmente se sente em casa, consigo mesmo, com o mundo?

“A questão não é, pois, saber se um homem é fraco ou forte, mas se pode suportar o peso dos seus sofrimentos, quer morais, quer físicos.” (op. cit., p. 70).

Imagino que pessoas com maiores conhecimentos sobre a mente humana ou assuntos relacionados possam vir a falar melhor sobre isso. Portanto, focarei, agora, brevemente, na obra de Goethe. Um primeiro ponto a se observar é a narrativa, que utiliza bastante dos pronomes “vós” e “tu”, o que pode causar uma estranheza na leitura. Fora isso, achei a linguagem fluída e, até, um tanto encantadora. São várias cartas, então pode-se dizer que há alguns “furos”, algumas cenas e episódios de que não temos conhecimentos, mesmo porque, sendo cartas, só temos noção do que é contado ao destinatário. Além de que não sabemos o que contém nas cartas que Werther recebia de resposta, apenas algumas menções nas próprias cartas de Werther. De algum modo, durante a leitura, me lembrei de As vantagens de ser invisível, de Stephen Chbosky. Apesar de bem diferentes, são cartas, possuem narrativas fluídas e, por algum motivo, falam dessa amplitude da existência humana. Mas pode ser só um equívoco meu.
Diria que esta é uma das obras que tem de ser lidas em algum momento da vida. Pode ser meio romântico demais para algumas pessoas? Pode. Talvez seja mesmo. Contudo, a beleza de Os sofrimentos do jovem Werther não está apenas na superfície, em ser um rapaz sensível que, pelas decepções da vida, tira a própria vida com as armas do noivo de sua amada. A obra tem sua elegância nisso também, claro, mas também por abordar um assunto tão delicado, em meio a tantos outros, conseguindo, com certa sutileza e certo arrebatamento, falar de tópicos tão fortes.
Por outro lado, não posso deixar de pensar e comentar que muitas pessoas evitam o livro justamente por isso, pelos temas fortes e pelo teor dramático. E me pergunto: Por que evitar temas fortes? Por que evitar o drama?
Por fim, convém questionar o seguinte: a obra pode ser considerada culpada ou associada aos suicídios? Acho que, de algum modo, sim, mas, de outro, não. Diria que, no máximo, a obra pode ser a última gota para o copo transbordar, o gatilho que as pessoas precisam para se impulsionar a fazer algo. Mas jamais culparia a obra. Ela jamais fará com que alguém se mate sem ter, anteriormente, essa tendência. Porque a obra, a meu ver, mostra que o suicídio não é de todo uma fraqueza. Talvez até que as pessoas precisam ser fortes para fazer isso. Precisam atingir um limite de suas existências. Enfim... Cada caso é um caso, não devemos julgar com os julgamentos e conceitos que temos. E que devemos pensar um pouco nisso.

“E é esta a característica mais evidente do nosso espírito, supor que é tudo confusão e trevas aquilo sobre o que não sabemos nada ao certo.” (op. cit., p. 143).


BARBERY, Muriel. A elegância do ouriço. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. 7ª reimpressão. Tradução de Rosa Freire d’Aguiar.

GOETHE, Johann Wolfgang. Os sofrimentos do jovem Werther. Porto Alegre: L&PM, 2014. Tradução, organização, prefácio, comentários e notas de Marcelo Backes. 192 p. (Coleção L&PM POCKET; v. 217).

terça-feira, 5 de julho de 2016

Breve Apresentação~ [Primeira Postagem]



Olá, leitores!

Parece-me estranho começar o blog partindo direto para um texto, então, eis uma pequena introdução do que se poderá encontrar por aqui. 

Como parto da opinião de que o drama é essencial à vida humana, provavelmente todos os textos por aqui terão algo um tantinho dramático. Digo, como saber que somos felizes se não conhecemos a tristeza? Além de que pensar sobre temas assim nos ajuda a crescer, e muito.

Sobre o tipo de leitura que se encontrará, por aqui, comentada, bem... Muito provável que clássicos. E clássicos. E livros com bastante drama. Não que eu não leia outras coisas, leio sim, embora seja um tanto exigente quanto a isso. Continuo sendo colaborada do blog Eu Curto Literatura, então, minhas leituras mais contemporâneas irão para lá.

Não digo que meus textos aqui serão resenhas, porque já tenho um texto preparado para o blog que não se parece com uma resenha, é mais um comentário extenso. Aliás! Esse é um ponto muito importante: de algum modo não consigo escrever textos pequenos, como essa introdução que estou fazendo agora, então, é, por aqui se terá bastantes textos longuinhos. ;)

(Sobre a criação do blog, do título e de minha pessoa, acho que a página "Sobre" explicará o essencial.)

Bem, é isso! 
Que se comece a caça aos ouriços!